terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Crônicas de 88 IV

O caldo engrossa
(Chegam os Têxteis!)


Os trabalhadores têxteis da Cia. De Fiação e Tecidos Santa Rosa tanto quanto os metalúrgicos da Santa Rosa Máquinas não mais suportavam a pressão da empresa e o descaso da Direção do Sindicato dos Trabalhadores Têxteis de Valença. A empresa sempre querendo mais e o Sindicato... Bem, este, mantendo-se sempre distante das reivindicações da peãozada, parecendo mais um sindicato patronal do que um Sindicato de trabalhadores, eternizava seu peleguismo tendo a frente um Presidente de sobrenome "Paixão".
Em todo o tempo em que esteve Presidente do Sindicato, não se tem notícia de uma só vez em que o Paixão tenha falado em greve ou qualquer movimento capaz de alterar as relações estabelecidas com os empresários locais. Assim como não se tem notícia de disputas entre chapas nos processos eleitorais por ele capitaneados (neste e nos demais pontos, o Paixão segue à risca o que seus antecessores fizeram). Estas e outras práticas, vendidas como inerentes à uma categoria "cordata", "pacífica" e "ordeira", tinham por finalidade manter os trabalhadores nos limites da ordem patronal. Assim, qualquer proposta de greve ou qualquer movimento reivindicatório apresentado à Direção, era imediatamente visto como subversivo e contrário à paz social. Não era bem esse o ponto de vista dos trabalhadores...
Naquele 30 de novembro os operários têxteis de Valença percebiam que havia outro caminho. Que não precisavam continuar calados e, até certo ponto, omissos, enquanto eram usurpados em seus direitos. Os metalúrgicos da Santa Rosa Máquinas naquele momento davam o tom e apontavam o rumo: se o Paixão não queria, iriam sem ele! E tentaram fazer com que ele se sensibilizasse através de uma comissão formada por membros da Direção do Sindicato dos Metalúrgicos e Companheiros têxteis ligados ao Sindicato (inclusive um membro da Direção do Sindicato dos Têxteis, o Ori, fazia parte desta Comissão), sem, no entanto, conseguir êxito. Paixão foi irredutível. Preferiu ser "atropelado" pela categoria com o argumento de "ilegalidade" daquela greve.
Mais do que "sensibilizar" o Paixão, o que os dirigentes daquele movimento queriam era garantir a participação de alguém, numa possível negociação com o empresário, com um mínimo de representatividade legal (discutível, é claro!), já que sua ausência poderia ser empecilho à resolução do impasse criado com a greve. Assim, era racional querer o Paixão junto com os possíveis têxteis grevistas, não se tratando, portanto, de nenhuma questão política essencial ao movimento. Os Têxteis viriam para a greve mesmo sem o aval da Direção do seu Sindicato.
As conversas com os trabalhadores têxteis começaram tão logo a greve teve início. Os têxteis que saíram às 13:20 horas já entravam no clima, antecipando o que iria ocorrer mais tarde. E o que se esperava aconteceu. Um grupo de Companheiras e Companheiros têxteis, ainda engasgados com tudo que havia ocorrido durante a Campanha Salarial passada, assumiu a tarefa de, juntamente com os Metalúrgicos já em greve, estender o movimento à Cia. De Fiação e Tecidos Santa Rosa. E às 21:40 horas daquele 30 de novembro de 1988, os têxteis de Valença conheciam sua primeira greve em quase cinco décadas. O discurso era o mesmo para metalúrgicos e têxteis: a greve era a única forma de garantir nosso direito constitucional à uma jornada de 44 horas semanais de trabalho, segundo o nosso entendimento. O discurso convenceu.


No dia seguinte todo o grupo Santa Rosa estava envolvido por aquele movimento um tanto quanto "louco". As Fábricas 01 e 02 também tiveram suas atividades paralisadas pela ação dos piquetes e grupos de "convencimento" criados pelos Companheiros da Fábrica 03 e da Santa Rosa Máquinas. A partir daquele dia, e durante toda a duração da greve, tornou-se comum ver, circulando pelas ruas do centro da cidade, grupos de operários deslocando-se de um ponto a outro na intenção de garantir a continuidade da greve numa ou noutra unidade fabril. Também se tornaram corriqueiras as passeatas pelo Centro, as manifestações no Jardim de Cima, as demonstrações de solidariedade aos trabalhadores em greve e tudo o mais que uma greve daquela natureza pode suscitar na população de uma cidade como Valença. Também durante a greve a Praça Paulo de Frontin (Jardim da Estação), em frente à Fábrica 03, tornou-se ponto obrigatório para todos aqueles que queriam inteirar-se sobre a greve: passantes, curiosos, estudantes, trabalhadores de outras empresas, toda a sorte de pessoas aparecia no Jardim da Estação e na Rodoviária para "ver" o movimento. Ali, no Jardim da Estação e suas imediações, os grevistas viveram seus melhores e piores momentos daquele movimento histórico, que chamou atenção da população valenciana, definitivamente, para os problemas enfrentados pelos trabalhadores têxteis e metalúrgicos do Grupo Santa Rosa.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Crônicas de 88 III

O sonho do Zé Preá

Assim como o Ursinho, outros operários mostravam características marcantes. E esses, por conta de tais características ou não, ganhavam apelidos os mais diversos. Aliás, o mundo das fábricas é fértil para esse tipo de coisa. O trabalhador chegava e pronto, já era logo batizado. Os apelidos variavam enormemente, tanto quanto a forma como quanto ao conteúdo que representavam: Ursinho, Meião, Zé Ruela, Zé Preá, Zé Boceta, Feijão, etc. Alguns apelidos nada tinham a ver com o seu proprietário. Era o caso do Zé Preá.
O preá, como todo mundo sabe (e se não sabe, vai saber agora!) é um animalzinho roedor com calda atrofiada (segundo o Aurélio) parecido com um hamster, só que um pouco maior. É parecido também com o chamado “porquinho da índia”, sendo que as diferenças maiores estão na cor do pêlo e no caráter doméstico do “porquinho”. Entre as características comuns está a rapidez com que se movimentam, nunca parando muito num mesmo lugar por muito tempo. Pois é. Essa é a grande diferença entre o bichinho e o Zé. Um, rápido feito um bólide. Outro, lento, lento, caminhando sem a menor preocupação de chegar a lugar nenhum, lembrando mais um quelônio (um jabuti) do que um roedor.



Na verdade o apelido do Zé deveria estar relacionado a outras características suas, não ao seu andar. Por exemplo, à sua inteligência. Não à toa ele era um dos escolhidos do patrão para mexer nos seus carros, inclusive para auxiliá-lo na construção de máquinas super estranhas, como por exemplo um “jipão” com motor de picadeira que teve os chassis emendados e a cabine totalmente refeita dentro da Santa Rosa Máquinas. Segundo o Zé, o pior não foi trabalhar no estranho veículo, mas testá-lo nas ruas da cidade, visto que o tal carro não desenvolvia velocidade e, no trajeto de teste, estava a delegacia de polícia. O Zé tremeu nas bases ao se tornar motorista daquela “picadeira ambulante”, mas o patrão mandava...
O Zé aderiu desde o primeiro momento à GREVE. Antes mesmo de ela estar instalada freqüentava as Assembléias e discutia as suas resoluções. Não que fosse liderança dos operários, mas era guiado por um tremendo senso de justiça. Conseguia entender como poucos o que estava acontecendo e, sempre que emitia uma opinião, esta vinha carregada de sapiência e tranqüilidade. Mas a grande frase que ouvi do Zé e que se fixou em minha mente não foi nenhuma proposta revolucionária (dependendo do ponto de vista, seria!). Foi dita no primeiro dia da paralisação, quando a tarde já ia alta e, de fato, estávamos em GREVE. Num dos bancos da Praça da Estação sentávamos eu, o Zé, o Kardec, o Gilcimar e outros companheiros. A conversa, como não podia deixar de ser, girava em torno da nossa GREVE. Num determinado ponto do papo o Zé falou: “Hoje eu estou realizando um sonho antigo...” Olhamos para o Zé, aguardando a revelação: “É que, desde quando vim trabalhar nesta fábrica, tinha vontade de passar um dia inteiro sentado aqui, olhando o movimento. A GREVE tá realizando esse sonho”.
É. Além do caráter reivindicatório a GREVE trazia outros sentidos. Ela foi, por exemplo, a responsável por conhecermos melhor as pessoas com quem lidávamos diariamente. Também foi a responsável pela realização de vários sonhos, inclusive o do Zé.
Ao expor o seu sonho, Zé falava do imaginário de praticamente todos os operários daquela fábrica. Ele personificava um sonho coletivo de se rebelar contra a obrigatoriedade das oito horas de trabalho, contra as ordens da chefia, contra o mau humor dos encarregados, contra o barulho ensurdecedor da tecelagem. Enfim, o sonho do Zé revelava o nosso sonho coletivo: de, pelo menos durante a GREVE, levar uma vida igual a de nossos chefes e empregadores: ficar na praça, sem nenhuma preocupação com a produção, apenas vendo a vida passar.

domingo, 11 de dezembro de 2011

Crônicas de 88 II

“CUF” taí!


30 de novembro de 1988. 13 horas. A Direção do Sindicato dos Metalúrgicos de Barra do Piraí e região, tendo à frente o Companheiro Batista, realizava Assembléia com os metalúrgicos da Santa Rosa Máquinas em frente aos portões da empresa. Após descrever o processo de negociação desde o seu início e apontar as possibilidades segundo o seu ponto de vista, Batista franqueou a palavra, permitindo aos presentes a exposição de suas angústias, vontades e propostas.
Dos trabalhadores vinham relatos sobre o que ocorria dentro da fábrica. Inclusive sobre a reunião feita no dia anterior dentro das dependências da Santa Rosa Máquinas, convocada pelo próprio empresário, Sr. Júlio Vito. Na tal reunião o empresário exortava seus empregados ao afastamento do Sindicato; solicitava um “vestir a camisa da empresa”; criticava políticos de esquerda (inclusive a candidata a Prefeita pelo PT, Lindsey Fernandes) e, no final da conversa, duvidava da capacidade dos trabalhadores realizarem a “tão falada” GREVE. Na verdade, a ida do empresário à fábrica demonstrava já a sua preocupação com o que poderia ocorrer. Sua leitura da realidade, embora com elementos distorcidos, era clara. Ele sabia perfeitamente que a postura dos Sindicalistas Metalúrgicos, naquele momento, mobilizaria os trabalhadores e resultaria na GREVE. E o pior: arrastaria os operários têxteis para o movimento colocando-o em posição frágil diante da sociedade valenciana.

Todas estas informações, somadas àquelas colocadas pelos sindicalistas, ajudaram a construir o caminho a ser seguido a partir dali: instalar a GREVE por tempo indeterminado na Santa Rosa Máquinas. Às 13:20 horas do dia 30 de novembro de 1988 iniciava-se um novo tempo na relação entre “Dr. Júlio Vito” e seus empregados. Lá dentro da fábrica as notícias demoraram um pouco a chegar. Um turno terminava naquele horário. Outro iria até as 17 horas e o pessoal estava em horário de almoço.

Entre os trabalhadores da SRM vários guardavam características próprias: uns gostavam de motos, outros de cavalos, uns rápidos, outros, a lentidão em pessoa. Alguns reflexivos quase não falando, outros mais expansivos. Alguns, donos de personalidade e opiniões marcantes, outros, verdadeiros “marias-vão-com-as-outras”. Uns, com a fala clara, definida. Outros, tropeçando na língua de tão rápido que falavam. Era o caso do “Ursinho”.

“Ursinho”, além da fala rápida, também gostava de cavalos. Vivia enfeitado feito cowboy: fivelas grandes, chapéu, botas. Caipirão. Pois foi ele, que nem perto do Sindicato passava, o responsável pela notícia: - “A “CUF” taí!” No primeiro momento ninguém entendeu nada. E repetia o “Ursinho” enquanto, esbaforido, andava de um lado para outro da oficina: - “A “CUF” taí!”. Alguns segundos mais bastaram para que os trabalhadores do interior da fábrica concluíssem: “A CUT taí!” Onde CUT significava a Direção do Sindicato dos Metalúrgicos de Barra do Piraí e região. E o jeito desembestado do “Ursinho” era resultado da aprovação, pela maioria dos trabalhadores presentes à Assembléia, da proposta de GREVE por tempo indeterminado na Santa Rosa Máquinas.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Crônicas de 88


Ao final do ano de 1988 Valença foi sacudida por duas Categorias profissionais até então adormecidas. Os Trabalhadores Têxteis da Cia Santa Rosa e os Metalúrgicos da Santa Rosa Máquinas resolveram, após anos de sufocamento, dar um basta às situações vivenciadas no interior das empresas do Grupo SR. A deixa foi dada pela promulgação da Nova Constituição Federal e pelas expectativas geradas por ela. O "basta" ocorreu na forma de uma greve que durou dez dias. Durante esse tempo, denúncias foram feitas, mazelas foram expostas, e boa parte daquilo que era conhecido como "nata" valenciana revelou seus bolores.
A greve, entre outras coisas, provocou mudança radical na Direção do Sindicato dos Trabalhadores Têxteis, já que, da greve despontaram lideranças capazes de assumir tal Direção.
O presente projeto já existe há algum tempo. Inicialmente concebido como livro de crônicas, hoje ganha as páginas deste Blog. Expor aqui o material já produzido permitirá aos possíveis leitores a possibilidade de opinar ou, até mesmo, colaborar com informações que possam ser agregadas e traduzidas em outras crônicas.
Para começar, publicarei a Introdução e o primeiro capítulo. Semanalmente, se possível, publicarei os demais capítulos. Comentários, críticas e sugestões serão de bom alvitre. Espero que venham!


Crônicas de 88

(Histórias da Greve na SR Máquinas e Cia de Fiação e Tecidos Santa Rosa)




Introdução
(A Constituição cidadã)


Outubro de 1988, Valença, interior do Estado do Rio de Janeiro.
Assim como no resto do país, a população da cidade (principalmente a parcela que trabalhava nas fábricas de tecido) aguardava ansiosa os reflexos da promulgação da Constituição Federal, chamada pelo saudoso Dr. Ulisses Guimarães de “a Constituição cidadã”.
O destaque aos trabalhadores das fábricas de tecido é por conta da relação quase feudal mantida por alguns empresários do setor, o que dava aos tais operários uma qualidade de vida horrível, obrigados que eram a suportar exaustivas jornadas de trabalho, salários de fome, ameaças, altos níveis de insalubridade e, no caso das mulheres, incontáveis casos de assédio sexual advindos, principalmente, de chefes imediatos.
Embora a criação das principais empresas têxteis de Valença date do início do século passado, as relações internas a estas e destas com a cidade mantiveram-se inalteradas por todos esses anos. Os empresários, na ótica de grande parte da população, foram elevados à categoria de “beneméritos” pelo fato de “manterem os empregos dos pobres” e desenvolveram verdadeiras relações de compadrio com os operários, seus familiares e demais protegidos. Desta forma, acabaram os empresários, durante muito tempo, ficando acima do bem e do mal, inquestionáveis assim como suas práticas, deixando o papel de vilão para os encarregados, os chefes, enfim, para seus asseclas que assombravam, noite e dia, operários e operárias.
Embora fossem muitos os problemas vividos por trabalhadores e trabalhadoras das fábricas de tecido de Valença, um serviu de carro-chefe para o movimento paredista que se desenrolou naquele início de dezembro de 1988: a jornada de trabalho! É que, até a promulgação da nova Constituição, a jornada de trabalho legal era de quarenta e oito horas de trabalho semanal, sendo a jornada diária de oito horas. O Congresso Constituinte eleito em 1986, pressionado pela atividade do movimento sindical, reduziu a jornada semanal para quarenta e quatro horas e, a partir daí, instalava-se um questionamento na cabeça dos operários têxteis de Valença, principalmente na dos empregados da Santa Rosa: como seria a nova jornada semanal de trabalho? O questionamento era pertinente, pois, na visão dos operários, a nova Constituição vinha para melhorar a vida de todos. Portanto, nada mais justo que serem ouvidos (pelo menos isto!) e, em conseqüência, terem acatada a proposta corrente: a redução, em quatro horas, da jornada dos sábados, o que resultaria em mais descanso nos finais de semana. Afinal, se a Constituição era “cidadã”, que pecado havia em se exercer a cidadania? Mas não era bem este o entendimento da empresa!
Segundo os administradores da Santa Rosa Máquinas e da Cia de Fiação e Tecidos Santa Rosa, desde que fosse preservada a jornada semanal de quarenta e quatro horas, a redução poderia ser feita de outra forma, não necessariamente nos sábados. E a empresa, sem nenhuma conversa ou mesmo consulta aos seus operários, implantou uma jornada diária de sete horas e vinte minutos, preservando as quarenta e quatro horas semanais constitucionais mas entrando, definitivamente, em conflito com seus empregados. O que se observou na diferença das propostas foi, claramente, um choque entre a letra e o espírito da lei. A Constituição não trouxe, em nenhum artigo, obrigatoriedade para os empresários em ouvir, menos ainda em acatar propostas dos trabalhadores. Também não definiu a Lei Maior de que forma a nova jornada deveria ser implantada. Mas, às vésperas do século XXI, tendo sido a redução da jornada fruto da pressão do movimento sindical e tendo a mesma também o caráter de gerar empregos, a lógica nos permitiria acreditar que o processo de mudanças fosse diferente. Ainda que contasse com um Sindicato “pelego”, a Categoria certamente criaria seus interlocutores e teria condições de entabular negociações. O resultado, fosse outra a forma de instalar a nova jornada, poderia, inclusive, resultar na criação de novos postos de trabalho, melhorando o nível de vida da população valenciana mas, o que se viu foi o oposto. Ali, no momento de decidir de que forma as coisas seriam feitas, o empresário fez a opção de desmascarar-se! O choque que se seguiu e que resultou na GREVE iniciada em 30 de novembro na Santa Rosa Máquinas estendendo-se à Cia de Fiação e Tecidos Santa Rosa, e que durou até 09 de dezembro de 1988, deixou claro para Valença exatamente quem era o “Dr. Júlio Vito”. Deixou claro também que a era de peleguismo vivida pelo Sindicato da Categoria estava prestes a terminar. É esta história que pretendo, através destas crônicas, contar a partir de agora.


Sábados Rebeldes

Há muitos anos a data- base dos trabalhadores têxteis de Valença é 1º de outubro. Em 1988 não foi diferente. Assim como não foi diferente a maneira de conduzir a campanha salarial pelos Diretores do Sindicato da Categoria: Assembléias convocadas, trabalhadores comparecendo ao Sindicato e, no fim das contas, tudo como antes, ou seja, acordo fechado entre patrões e Sindicato sem a real interferência dos trabalhadores. Mas já havia algo de novo no ar.
A expectativa das novidades trazidas pela Constituição a ser promulgada somada à situação vivida pelos operários têxteis de Valença, mobilizou-os ainda mais. Eles compareceram em massa às Assembléias convocadas e até chegaram a pensar que naquele 88 seria diferente. Que nada! O Acordo foi assinado como sempre; nenhum ganho além das obrigações legais. Com relação à nova jornada de trabalho então, nada se falou. A panela ia ferver!
Dentro da Cia Fiação e Tecidos Santa Rosa o caldo engrossava a olhos vistos. Lideranças já despontavam e as defesas por uma nova acomodação da jornada de trabalho já se tornavam públicas. Também na Santa Rosa Máquinas as conversas ganhavam corpo mas, diferentemente da situação dos operários têxteis, os metalúrgicos contavam com a direção do Sindicato. Este, com sede em Barra do Piraí, promovia reuniões com os trabalhadores e tentava negociar a implantação da nova jornada com o empresário, sem, no entanto, obter sucesso. No meio dos metalúrgicos da Santa Rosa Máquinas a conversa também se avolumava, embora não houvesse um grau de coesão alto. A proposta de GREVE já era tida como certa.
A Direção do Sindicato dos Têxteis, tendo concluído a Campanha Salarial, deu as costas à Categoria no tocante à discussão da jornada de trabalho. Os trabalhadores buscaram, então, por conta própria, seus rumos. Os sábados iriam se tornar infernais para os encarregados e chefetes. Como a proposta defendida pelos operários visava reduzir as horas nos sábados, era chegar o fim de semana e começar a loucura: a “peãozada” pressionava a chefia que, sem ter como evitar, acabava “permitindo” a saída dos trabalhadores, o que, na prática, representava uma redução na jornada, ainda que oficiosamente. Durante alguns sábados o horário passou a ser definido pelos trabalhadores da seguinte forma: os operários do 1º turno (que pegavam às 05:00 da manhã), às 09:00 fechavam o ponto e saiam. Os do 2º turno (entravam às 13:20) faziam a mesma coisa quando batiam as 18:00 horas.
Esta situação desenrolou-se por alguns sábados nos meses de outubro e novembro de 88 e, de certa forma, servia para apontar que algo mais iria acontecer caso nada fosse feito. Os trabalhadores chegaram, inclusive, a pressionar a Direção do Sindicato dos Têxteis para que esta se posicionasse encampando a proposta dos operários. Uma reunião ocorreu, em pleno Jardim de Cima, no dia 15 de novembro (dia das eleições municipais) com a intenção de demover o Presidente do Sindicato dos Têxteis de sua postura omissa. Não adiantou. O sujeito manteve o argumento de que o momento para aquela discussão havia se passado com o término da campanha salarial e nada mais fez.
Com relação aos metalúrgicos da Santa Rosa Máquinas, as tentativas de negociação continuavam. A Direção do Sindicato solicitava, a empresava aceitava conversar mas, de concreto nada surgia. Após cada conversa com o empresário, nova Assembléia com os trabalhadores. Estes começavam a entender que a intenção do empresário era “ir empurrando a Categoria com a barriga”, até que, vencida pelo cansaço, parasse de perturbar. Por seu lado, a Direção do Sindicato dos Metalúrgicos amadurecia, juntamente com os operários, a idéia de realizar uma GREVE para garantir a instalação das quarenta e quatro horas semanais previstas na Constituição da maneira que os trabalhadores queriam.